O humano é o animal mais adaptável concebido pela natureza. É o que diz o senso comum.
Na era do gelo, um bando de nômades chegou a perder melanina para receber mais luz do sol no sangue.
Os continentes continuaram se deslocando. E os humanos, se adaptando aqui e ali. Iglus e fogueiras no gelo do ártico. Briga feia com crocodilos brabos nos pântanos da Oceania. E, você entendeu… Pra todo canto, tem um humano adaptado.
Criando vilas. Superando desafios cada vez maiores.
E vieram as cidades. E criamos as ruas, os esgotos…
Faltou terreno, e os prédios ficaram mais altos.
E veio a fome. E criamos o fast food. E criamos a televisão para gastar o tempo que tínhamos acabado de ganhar.
Cheia de momentos trágicos, cruéis e vergonhosos, a história humana é marcada pela superação. Somos, orgulhosamente, os animais com maior capacidade de adaptação já registrada.
Entretanto, temo trazer más notícias.
Em minhas observações, fica claro que alcançamos nosso limite. Nossa capacidade de adaptação não está acompanhando o ritmo que a contemporaneidade exige.
Notem: desde uma era anterior à pandemia, estamos nos preparando para reuniões on-line. As calls. Já tínhamos tudo: fibra ótica, câmeras e microfones, aplicativos de conexão. Estava tudo aí. Só faltava… bem, a gente se adaptar.
Pois já se passaram dezenas de meses que a quarentena forçada nos conduziu à evolução.
E como continentes que se afastam, colegas de trabalho aprenderam a dialogar com a distância. Temos resiliência. Tudo vai bem, você imagina.
Não vai.
Eu avisei que trazia más notícias.
A digitalização das reuniões exige precisão no diálogo. Portanto, preparação.
Exige ouvir e depois falar, pois o sistema não comporta duas vozes muito bem. Exige paciência com o silêncio alheio. Exige que sejamos humanos evoluídos. Mas não estamos conseguindo. Infelizmente, alcançamos nosso limite. Os continentes não voltarão. E estamos todos perdidos.
É o fim.
Desde dois mil e vinte estamos fazendo apresentações on-line. E ainda perguntamos: vocês estão vendo a minha tela? — Ainda?!! — É claro que estamos vendo a sua maldita tela!!! Já teve dois réveillons, novas variantes, novo lockdown, novo decreto, tudo novo. E ainda perguntamos se as pessoas estão vendo nossas telas.
Não acho que conseguiremos.
Temo pelo pior.